A Dama de Ferro, FHC e o Consenso de Washington (*)?Estabilizar, privatizar e liberalizar tornou-se o mantra de uma geração de tecnocratas que estavam tendo sua primeira experiência no mundo subdesenvolvido e dos líderes políticos por eles aconselhados?. (Dani Rodrik, Professor de Política Econômica Internacional, Universidade de Harvard - EUA)
O Consenso de Washington constituiu-se em um conjunto de dez regras básicas formulado no fim de 1989 por economistas de instituições financeiras situadas em Washington DC, como o Fundo Monetário Internacional (FMI), o Banco Mundial e o Departamento do Tesouro dos Estados Unidos, fundamentadas num texto do economista John Williamson e que se tornou a política oficial do FMI em 1990, quando passou a ser "receitado" para promover o "ajustamento macroeconômico" dos países em desenvolvimento que passavam por dificuldades.
Segundo estudiosos, a questão agora não é saber se o Consenso de Washington ainda vive; é saber o que deverá substituí-lo. O Brasil demonstrou nos últimos anos, em especial nos anos 90, a "falsidade neoliberal da contradição entre o equilíbrio das políticas macroeconômicas e o aprofundamento e ampliação das políticas sociais de equidade e inclusão" e que, a época, teve como um grande seguidor e executor o ex-presidente FHC através de seus ministros Bresser Pereira e Sérgio Mota, tendo como linha mestre de seu governo: privatizar a qualquer custo e tornar o Estado mínimo possível, incluindo redução do corpo de funcionários e seus salários.
E por falar em estado mínimo, uma de suas maiores protagonistas a premiê Margareth Thatcher, a dama de ferro, que faleceu no último dia 08 de abril, adotou medidas que devolveram ao Reino Unido uma posição de destaque e o colocaram em um caminho de recuperação após a crise dos anos 70, mas também abriram espaço para o desemprego, o aumento da desigualdade social e a triplicação da pobreza infantil entre 1979 e 1995 .
A expressão "Consenso de Washington", originalmente utilizada para significar: "o mínimo denominador comum de recomendações de políticas econômicas que estavam sendo cogitadas pelas instituições financeiras baseadas em Washington D.C. e que deveriam ser aplicadas nos países da América Latina? acabou por fugir ao controle de seu criador e vem sendo usada para abrigar todo um elenco de medidas para justificar políticas neoliberais, tendo nelas como principal seguidora no mundo, verbi gratia, a ex-primeira ministra inglesa Margareh Thatcher, recentemente falecida.
O FMI passou a recomendar regras neoliberias nos países emergentes durante a década de 1990, como meios para acelerar seu desenvolvimento econômico e desde o início essas idéias foram aceitas e adotadas por dezenas de países sem serem muito questionadas, dos quais o Brasill, como já dissemos, foi um grande discípulo.
Aqui vale lembrar a Emenda Constitucional nº 19, de 04/06/1998 instrumento legal que reconfigurou o aparelho de Estado e que flexibilizou a administração pública no país nos moldes do Estado neoliberal. Foi o dispositivo legal que abarcou o conjunto dos servidores, facilitando o manejo dos mesmos de acordo com os interesses do bloco político no poder. Faz parte da tática de centralizar para descentralizar, ou seja, para que os governos neoliberais pudessem aplicar as suas políticas fez-se necessário que os mesmos desconstruíssem o aparato legal que garantia os direitos dos trabalhadores, inclusive dos servidores públicos. Os estragos deixados pelos ventos neoliberais para a máquina pública são sentidos lamentavelmente até os dias de hoje e deverão por longos anos e suas consequências estão aí: baixa do nível da educação, serviço de saúde pública decadente, aumento da criminalidade, do tráfego de armas, munições e drogas etc ...
Entre as medidas liberais trazidas pela citada Emenda, os servidores tiveram sua estabilidade questionada através da Lei Complementar nº 101, de 04.05.2000 , que passou a ser chamada de Lei de Responsabilidade Fiscal, estabelecendo os limites de gasto na administração pública. Tal lei tem sido utilizada para a terceirização dos serviços públicos, entendida como precarização, para a recusa na concessão de reajustes, reposições e revisões salariais e benefícios tais como indenização de transporte, auxílio alimentação e regulamentação de Planos de Cargos, Carreiras e Salários.
Após a grave crise asiática, em 1997, da quase quebra da Rússia, que viu seu PIB cair 30%, da "quebra" da economia Argentina, apesar do país vizinho ter total zelo na aplicação da cartilha do FMI, tudo isto foi levando o próprio FMI a abandonar o dogmatismo inicial imposto aos países endividados, em especial os chamados emergentes. É fato que o Consenso de Washington levou à desestabilização econômica e produziu crises, não só na Europa como trouxe o aumento das desigualdades sociais na América Latina, uma vez que trazia no seu nucleo central dez regras básicas que sejam: Disciplina fiscal - Redução dos gastos públicos - Reforma tributária - Juros de mercado - Câmbio de mercado - Abertura comercial - Investimento estrangeiro direto, com eliminação de restrições - Privatização das estatais - Desregulamentação e afrouxamento das leis econômicas e trabalhistas - Direito à propriedade intelectual.
O entusiasmo despertado pelas reformas preconizadas pelo Consenso de Washigton foi tal em muitos países, inclusive no Brasil, que a lista de dez recomendações tornou-se humilde e inócua por comparação. A liberalização e abertura para os fluxos de capitais internacionais foi muito além daquilo julgado adequado e prudente para aplicação em muitos países subdesenvolvidos. Apesar dos protestos, a agenda de reformas passou a ser percebida, ao menos por seus críticos, como um esforço ideológico destinado a impor o neoliberalismo, e o fundamentalismo de livre mercado, aos países emergentes.
Uma das coisas que é hoje quase consensual acerca dessas reformas é que as coisas não sairam como fora planejado. Mesmo os mais ardorosos defensores das políticas preconizadas pelo Consenso de Washington concordam que o crescimento ficou muito aquem do esperado, em especial na América Latina, e que o "período de transição" foi muito mais profundo e duradouro nas economias anteriormente socialistas do que fora imaginado.
A África Sub-Sahariana não 'decolou', a despeito das reformas políticas, nas melhoras das políticas externas e do contínuo influxo de ajuda econômica e os sucessos foram poucos além de o mundo sofrer recorrentes e dolorosas crises financeiras imprevisíveis. O crescimento da América Latina em termos per capita ficou muito abaixo do período 1950-80, apesar do desmantelamento das políticas estatizantes, populistas e protecionistas dos antigos regimes da região. O colapso econômico na zona do euro, via elevação dos déficits públicos e endividamento dos países produtores, decorrente, também, de transferências de capital para os mesmos, denota a insustentabilidade do sistema e a ausência de crescimento e de criação de postos de trabalho. A concentração de riquezas acentua a via capitalista de dominação.
Com mais uma crítica ao famigerado Consenso, a centenária e respeitada revista britânica The Economist de linha editorial liberal, comentou que "é amplamente reconhecido que a liberalização dos mercados financeiros domésticos e os fluxos de capitais através das fronteiras foram uma das causas principais da crise asiática".
Para o economista coreano radicado na Inglaterra Ha-Joon Chang, professor da Universidade de Cambridge, um dos mais veementes críticos do Consenso de Washington, este teria sido uma espécie de "armadilha" criada, na década de 1980, pelos países desenvolvidos de então para impedirem que os países subdesenvolvidos e, em especial, aqueles que estavam emergindo do bloco comunista, conseguissem atingir os mesmos níveis de desenvolvimento do então Primeiro Mundo e que pregava práticas liberalizadoras como única forma de se contornar as crises da Década Perdida, mas tais práticas seriam o exato oposto daquelas praticadas pelos países desenvolvidos quando de seu desenvolvimento.
Ao pregarem a extinção de barreiras alfandegárias, que deveriam ser substituídas por tarifas alfandegárias e ao pregarem o livre comércio internacional com políticas de austeridade fiscal, os países desenvolvidos planejariam manter seu status e, sobretudo, manter o status de subdesenvolvimento dos países subdesenvolvidos. Na prática, o que estamos vendo é um descontrole total do Estado com relação ao alto índice de violência e um fluxo incontrolavel de drogas e armas pelo mundo afora.
Mesmo com toda tragédia que foram as privatizações, onde vimos dilapidarem o patrimônio da sociedade, o Brasil ainda não aprendeu com a história, pois ainda insiste em promover periodicamente políticas públicas sem qualquer lastro técnico ou social que, intencionalmente, levam a alienação, ao desconhecimento dos direitos e da importância do Estado, ao desmonte do serviço público, um dos segmentos de notória capacidade e que extirpou ocupantes de carreiras que representavam elites que desconheciam instituições, tais como concursos públicos e capacidade profissional. Ou seja: o pensamento que cidadania é exclusividade dos detentores do poder.
(*) texto produzido consultando a enciclopédia Wikipédia ? site www.wikipedia.org.br
Autores:
- Elias Carneiro Jr.
Auditor Fiscal da Receita Federal do Brasil
bacharel em ciências juridicas e econômicas ? especialização em Direito Tributário e líder sindical.
- Carmem Cenira Pinto Lourena Melo: Auditora Fiscal do Trabalho, graduada pela Faculdade de Direito da USP, pós-graduada com especialização em Negociação Coletiva pela UFRGS e Economia do Trabalho e Sindicalismo pela UNICAMP, cursando MBA em Gestão Pública pela FMU e dirigente sindical