Segundo Departamento de Trabalho, 102 menores trabalharam ilegalmente. Processadora de carne demitiu prestadora e contratou auditoria independente para avaliar situação
Por O Globo Com NYT
Uma empresa terceirizada da JBS nos EUA, a Packers Sanitation Services, pagou multa de US$ 1,5 milhão no mês passado após uma investigação conduzida pelo Departamento de Trabalho revelar que crianças de 13 a 17 anos trabalharam em turnos noturnos em 13 fábricas de processamento de carnes de diversas empresas em oito estados, principalmente no Sul e no Centro-Oeste dos EUA.
Análogo à escravidão: Relatos de agressão física contra trabalhadores resgatados no RS são os primeiros desde 2000
Questão de gênero: Supervisora de linha aérea ganhava 22% menos que homens e era alvo de chacota: 'estagiária'
Trata-se de uma das maiores empresas de limpeza de fábricas de alimentos nos Estados Unidos . A investigação indica que ela empregou ilegalmente ao menos 102 crianças em trabalhos perigosos na limpeza de frigoríficos e abatedouros, segundo o órgão de controle americano.
Reportagens publicadas nos EUA sobre o assunto listam empresas como JBS, Cargill, Tyson Foods, George's Inc, Buckhead Meat de Minnesota, Gibbon Packing, Greater Omaha Packing, Maple Leaf Farms e Turkey Valley Farms como as que contratavam serviços da Packers Sanitation Services e tiveram unidades onde houve trabalho executado por menores de idade.
A JBS informou em reportagem recente do New York Times que não sabia que as crianças trabalhavam na limpeza da fábrica. Em nota ao GLOBO, a empresa informou que exige de seus parceiros a adesão aos mais altos princípios éticos, conforme descrito em seu código de conduta de associados de negócios.
"Ao ser informada sobre o ocorrido nessas instalações, a companhia imediatamente cancelou o contrato com a empresa terceirizada e contratou uma auditoria independente em todas as suas instalações para avaliar minuciosamente essa situação", afirma a nota da empresa, que diz ainda ter "tolerância zero para trabalho infantil, discriminação ou condições de trabalho inseguras".
M. Officer: Empresa é condenada por submeter trabalhadores bolivianos a condições degradantes
A investigação do Departamento de Trabalho aponta que as crianças usaram produtos químicos perigosos para limpar equipamentos de processamento, incluindo serras traseiras, serras de peito e divisores de cabeça. Seus investigadores descobriram que pelo menos três menores foram feridos enquanto trabalhavam para a empresa.
De acordo com as regras de trabalho justo, a empresa foi multado em U$S 15.138 por criança empregada ilegalmente - a penalidade monetária civil máxima permitida pela lei federal.
A revelação do episódio suscitou críticas entre os especialistas de que as penalidades são insuficientes para proteger os trabalhadores e impedir que as empresas violem leis trabalhistas.
- É realmente vergonhoso que o nível de multa seja tão baixo. A multa não é forte o suficiente para impedir o uso de trabalho infantil na indústria frigorífica - disse Celine McNicholas, diretora de políticas do Economic Policy Institute, um grupo de pesquisa que busca melhorar as condições dos trabalhadores.
Produtividade: Trabalhar no fim de semana virou o 'novo normal': média supera 6 horas aos sábados e domingos
Violações sistêmicas
Com sede em Kieler, Wisconsin, a Packers emprega mais de 16.500 trabalhadores e fornece trabalho contratado em centenas de abatedouros e frigoríficos em todo o país, de acordo com seu site.
- As violações de trabalho infantil neste caso foram sistêmicas e atingiram oito estados, e indicam claramente uma falha corporativa por parte da Packers Sanitation Services em todos os níveis - disse Jessica Looman, vice-administradora da Divisão de Salários e Horas do Departamento de Trabalho americano.
Ela ainda acrescentou:
- Essas crianças nunca deveriam ter sido empregadas em frigoríficos e isso só pode acontecer quando os empregadores não assumem a responsabilidade de impedir que violações do trabalho infantil ocorram em primeiro lugar.
Trabalho escravo no RS: Produtores da Serra Gaúcha se comprometem a criar central de denúncias
A Packers Sanitation Service disse em um comunicado estar “satisfeita por ter finalizado este acordo” como parte de uma resolução, aprovada por um juiz federal em dezembro, que encerrou a investigação do Departamento de Trabalho.
"Fomos muito claros desde o início: nossa empresa tem uma política de tolerância zero contra a contratação de menores de 18 anos e compartilha totalmente o objetivo do Departamento de Trabalho de garantir a conformidade total em todos os locais”, disse o comunicado Packers.
“Assim que tomamos conhecimento das alegações do Departamento de Trabalho, realizamos várias auditorias adicionais de nossa base de funcionários e contratamos um escritório de advocacia terceirizado para revisar e ajudar a fortalecer ainda mais nossas políticas nessa área”, acrescenta.
Queimaduras e ferimentos
A Packers pagou a multa cerca de três meses depois que um juiz federal aprovou uma liminar que exigia que a empresa parasse de “empregar trabalho infantil opressivo” e cumprisse a investigação do departamento sobre suas práticas de contratação.
Em Bento Gonçalves: Turistas avaliam que culpa por condições dos trabalhadores é da terceirizada, não das vinícolas
Segundo o departamento, algumas das crianças envolvidas nesse tipo de trabalho sofreram queimaduras químicas cáusticas e outros ferimentos.
Um jovem de 14 anos, que trabalhava das 23h às 5h, cinco a seis dias por semana, sofreu queimaduras químicas causadas durante a limpeza de máquinas usadas para o corte da carne. Os registros escolares mostraram que a criança dormiu na aula ou faltou à escola por causa do trabalho na fábrica, informou o departamento.
"Nossa investigação descobriu que os sistemas da Packers Sanitation Services sinalizavam alguns trabalhadores jovens como menores de idade, mas a empresa ignorou as sinalizações", disse Michael Lazzeri, administrador regional em Chicago da Divisão de Salários e Horas do Departamento de Trabalho americano, em comunicado.
Lazzeri afirmou ainda que “quando a divisão de salários e horas chegou com mandados, os adultos – que recrutaram, contrataram e supervisionaram essas crianças – tentaram atrapalhar os esforços para investigar suas práticas de emprego”.
Saúde do trabalhador: ‘Burnout’ cresce e evidencia desequilíbrio entre trabalho e vida pessoal
A Packers Sanitation Services disse que o Departamento do Trabalho não identificou nenhum gerente acusado de conduta imprópria que ainda estivesse empregado pela empresa. A empresa também informou ter realizado treinamento para gerentes de contratação, “incluindo a detecção de identidade falsa”.
A empresa afirmou que nenhum dos menores citados pelo Departamento do Trabalho ainda trabalha para a Packers, e afirma que muitos saíram “anos atrás”.
A Packers acrescentou que usa o sistema E-Verify, biometria entre outras verificações para rastrear seus funcionários e que está “totalmente comprometida em trabalhar com o Departamento de Trabalho para fazer melhorias adicionais para impor nossa proibição de empregar menores de 18 anos”.